sábado, 29 de outubro de 2011

POESIA E IMAGEM: UM MATRIMÔNIO DE SUCESSO





O autor da máxima “uma imagem vale mais que mil palavras” provavelmente não considerou que as tais “mil palavras” em questão estivessem em forma de poesia. Afinal, como poderíamos comparar a profundidade de uma poesia, que descreve das mais simples paisagens aos mais complexos sentimentos, a uma fotografia, que nem sempre retrata a veracidade de uma situação?
Indo mais a fundo, poder-se-ia dizer, ainda, que poesia e fotografia caminham de mãos dadas. Consideremos o fértil campo do cinema, que nada mais é que uma sucessão de fotografias. Fosse a imagem suficiente para descrever qualquer cena que fosse, o cinema mudo não necessitaria legendas para se fazer entender, caso contrário os filmes sem diálogo perdurariam até hoje, o que não acontece justamente devido a tal interdependência. O fato é que a imagem ganha força e atinge sua plenitude máxima quando acompanhada das palavras certas e vice-versa.
A exemplo dos cineastas, também os poetas, principalmente os concretistas, viram a necessidade de aliar a mensagem ao visual, dada a preocupação dos últimos em aliar o conteúdo que escreviam à forma do mesmo, diferente da poesia convencional. Tal experimentalismo, em contrapartida ao cinema, pode ser observado em abundância no cinema noir, ou nouvelle vague francês, onde, além da poesia inerente tanto ao cenário quanto aos roteiros, observava-se grande preocupação estética, indo do tratamento preto e branco das imagens (cooptado mesmo quando o technicolor – técnica de colorização de filmes – já estava disponível) ao ambiente sempre romântico e até certo ponto utópico retratado pelos diretores daquelas películas.
No cinema contemporâneo, um nome a ser citado é o do diretor americano David Lynch. Para muitos, o cinema nonsense de Lynch estaria mais para um videoclipe sem pé nem cabeça que para uma obra de arte propriamente dita. Para a minoria restante, onde me encaixo, a obra do cineasta aliaria uma poesia de vanguarda, abstrata e contemporânea - alheia aos ditames do poesia clássica - a um trabalho de imagem igualmente poético, preocupado em complementar a mensagem transmitida ao público.
Opções que ilustram o casamento de sucesso entre poesia e imagem não faltam, o que nos permite concluir não que uma imagem vale mais que mil palavras e sim que a imagem certa permeada pelas palavras adequadas, essas sim, valem mais que mil palavras e mil imagens sem conteúdo juntas.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

A ILHA DO MEDO (2011)


Tivesse eu assistido a esse filme ano passado, teria sido totalmente diferente a minha interpretação sobre o mesmo, já que, além da satisfação que um filme nos causa, outro quesito importante a considerar são as referências que podemos traçar entre obras (literatura, filmes, música) que já conhecemos e as que estamos conhecendo ou prestes a conhecer.
A razão de tamanha mudança é que nesse ano, durante o primeiro ano da faculdade de Letras-Inglês, estou aprendendo sobre psicologia e filosofia.
Da primeira matéria, auxiliou a mudar minha visão sobre o filme o conceito de psicanálise, desenvolvido por Sigmund Freud. A conexão com o filme se observa na supressão de memórias que o personagem principal, vivido por Leonardo di Caprio, se vê obrigado a exercer para que possa se manter vivo. Tamanha é a influência dos acontecimentos que o personagem se obriga a esconder sua personalidade principal e assumir um alter-ego, esse sim sem um horrível passado a esconder.
A estória, como era de se esperar, se passa em um hospital psiquiátrico para criminosos perigosos, localizado na Ilha Shutter. Di Caprio, o agente Teddy Daniels, chega a essa ilha acompanhado de Chuck, um parceiro policial, interpretado por Mark Ruffalo. A missão dos dois seria descobrir o paradeiro de uma perigosa interna que teria escapado misteriosamente da ilha.
A estadia, que deveria durar ao menos até o mistério ser resolvido, acaba sendo reduzida devido a recusa que o diretor do hospital (Ben Kingsley) oferece aos pedidos de documentação e entrevistas requisitados pelo oficial. O retorno antecipado também acaba sendo adiado, devido a uma tempestade inesperada que assolou a ilha na mesma noite.
O prolongamento acaba dando à Di Caprio a oportunidade de vasculhar melhor a ilha, e, assim, ter a oportunidade de levar a cabo sua verdadeira intenção no local: encontrar o suposto incendiário que teria posto fogo na casa de sua falecida mulher, matando a ela e seus dois filhos.
Acresce-se a lista de descobertas uma ex-psiquiatra do hospital, que faz revelações bombásticas ao agente sobre algumas atividades "secundárias" que acontecem na ilha, fato este que acaba turbinando ainda mais a paranóia de Di Caprio.
A trama ganha pouco a pouco contornos cada vez mais esquizofrênicos, alternando o ponto de vista dos médicos e do agente, chegando-se a um ponto quando não sabemos mais em quem acreditar. É nessa hora que um flashback, inspirado na tragédia grega de Medéia (eis minha contribuição da aula de Filosofia), nos ajuda a entender quem tem realmente razão. Tanto na versão original quanto nesta atual, é realmente algo difícil de engolir, até mesmo para Leonardo di Caprio.
Para os que não estão familiarizados com os conceitos de psicanálise e da tragédia grega em questão, talvez esse filme não cause o mesmo impacto que causou em mim. Ainda assim, apesar de grosso modo ser um thriller cujo roteiro é relativamente batido, aspectos como atuação, a fotografia (o clima sombrio do filme é muito bem produzido), a trilha sonora (de grande serventia para a construção do clima de suspense) e principalmente a confusão que o diretor acaba conseguindo causar no espectador fazem de A Ilha do Medo um filme a ser assistido com bons olhos.

sábado, 22 de janeiro de 2011

THE KING'S SPEECH (2010)


Dentre os candidatos à premiação de melhor filme do Globo de Ouro deste ano, o que mais me agradou foi O Discurso do Rei e, apesar de A Rede Social ter levado o premio acima citado, é meu favorito ao Oscar daquela categoria.
A primeira razão é o roteiro do filme, que se encaixa naquela fórmula de um protagonista (nesse caso o rei George VI, da Inglaterra) que vence grandes dificuldades (uma gagueira de origens emocionais) com o auxilio, digamos, da última opção disponível (um terapeuta vocal que aprendeu suas técnicas durante a guerra).
Colin Firth (merecidamente vencedor do Globo de Ouro de melhor ator principal) encarna o segundo na linha de sucessão monárquica, sendo cooptado apenas por suas restrições de discurso e substituído, às pressas após a morte de seu pai, por seu irmão boêmio , o rei Edward VIII (vivenciado pelo canastrão Guy Pearce, convincente no papel). Acontece que Edward acaba diante de uma encruzilhada moral: sua pretendente já foi divorciada duas vezes e, não podendo desposa-la por razões do protocolo real, acaba optando em deixar o cargo ao irmão.
Nesse ínterim, o ainda Duke de York (Firth), já farto de fracassos nos diversos terapeutas a que havia recorrido, acaba sendo convencido pela futura rainha Elizabeth (a carismática Helena Bonham Carter, de Clube da Luta) a tentar uma última cartada, experimentar os métodos pouco ortodoxos do ex-ator de teatro e terapeuta vocal Lionel Logue, encarnado pelo excelente e injustiçado Geoffrey Rush. A relação entre médico e paciente começa tumultuada, prejudicada sobremaneira pela soberba do Duque de York, que acaba sendo amolecida aos poucos pelos inéditos resultados que Lionel, como o mesmo insiste que o chamem, acaba demonstrando.
O morango do bolo acaba ficando para o final, quando, em um momento regido magistralmente pelo diretor Tom Hooper, o então monarca vê-se obrigado a dar um discurso via rádio para sua nação, anunciando a guerra contra os alemães de Hitler. Permeado por uma trilha clássica que faz tremer da cabeça aos pés, Firth protagoniza um dos momentos de maior emoção histórica que já pude presenciar nos filmes que já assisti. Um deleite poder presenciar a melhor atuação de Firth que já vi e também Geoffrey Rush finalmente retornando a receber um papel que exigisse mais de seu grande talento, como visto em Shine, de 1996.